domingo, 25 de outubro de 2009

Alfenim*

De tarde, depois que sopra aquele vento agreste
Me deito e durmo
E sonho com aquela tarde
Com bichos, com árvores
Com nuvens

Ao anoitecer, vagueio pelo Centro
E sinto a bruma daquela aréola que se põe
E tenho medo, me sinto frágil, inconstante
Subjugado pela crosta humana que me cobre
Quase nu

E depois da noite Severina
Quando o pavio da lamparina já está no fim
O dia raia em gotas de tocaia
Doce e teimoso
Feito um alfenim

(Rodrigo Vaz)

*Confeito alvíssimo, sólido mas delicado e quebradiço, preparado com melado, que se deixa ao fogo até atingir um ponto especial, quando, então, se retira a massa do fogo, estendendo-a sobre um mármore ou qualquer outra superfície fria. Então, puxa-se a massa com as mãos polvilhadas de goma até alvejar, e solidificar, podendo-se, antes, dar-lhe as mais variadas formas.

segunda-feira, 12 de outubro de 2009

Gozo


Tesão. Dominava todo o ritual do acasalamento. Forçava o teor dos seios. Franzia o clítoris. Tereza. Tesuda. Terezuda.

(Rodrigo Vaz)

Alívio


Acordou. Levantou. Foi até o computador. Estava com vírus. Desligou. Foi até o banheiro. Defecou. A descarga estava quebrada. Vestiu aquela calça surrada, aquela meia furada no dedão. Não esqueceu o boné para trás. Abriu a geladeira. Não havia água gelada. Na mesa da cozinha: uma maçã. Na pia: uma faca.

(Rodrigo Vaz)

Suspiro



Levantou. Disse que não agüentava mais. Correu até a porta de entrada. Abriu-a. Fitou aquela nuvem com cara de palhaço. E gritou


(Rodrigo Vaz)

quinta-feira, 8 de outubro de 2009

Primeiro Ato

Em casa, varro a sujeira da cozinha
No banheiro, resolvo com as mãos o que a cabeça não destina
Na rua, sigo rumos e tomo vinho
Na floresta sou bicho-grilo, na cidade: um brigadeiro

Tiro os sapatos
E jogo tudo pro alto
Sinto o chão...
Aprendo a andar descalço em um mundo de asfalto

(Rodrigo Vaz)

domingo, 4 de outubro de 2009

Sublimação

Decorada com cores vibrantes
A mesa posta na frente dela
Um vinho carreteiro e duas taças
Para que tanta sofisticação!

As pernas cruzadas
Impedem qualquer ousadia
Exaurem qualquer idéia sacana
Filha da puta!

Quebro a taça
E jogo o vinho em seu vestido
Te entrego uma toalha para limpar-se e te mostro o banheiro
Depois, é só poesia!

(Rodrigo Vaz)

Primavera nos dentes


Quem tem consciência para ter coragem

Quem tem a força de saber que existe

E no centro da própria engrenagem

Inventa a contra-mola que resiste

Quem não vacila mesmo derrotado

Quem já perdido nunca desespera

E envolto em tempestade decepado

Entre os dentes segura a primavera